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Morcegos são os hospedeiros reservatórios de muitos vírus zoonóticos que infectam humanos. Alguns desses vírus que vivem no morcego causam consideráveis patologias humanas e outros podem ser de potencial importância em doença de animais domésticos; assim, como vimos com os surtos epidêmicos e pandêmicos no início do século 21, morcegos são um fator de risco importante na saúde animal.

Os vírus de importância na saúde humana que têm morcegos como seus hospedeiros reservatórios incluem: 

Vírus da raiva (um Rabdovírus) – Capítulo 20

Síndrome respiratória aguda grave pelo Coronavírus 1 (SARS-CoV-1), o agente causador da SARS – Capítulo 25

Síndrome respiratória do Oriente Médio pelo Coronavirus (MERS-CoV), o agente causador da MERS – Capítulo 25

Síndrome respiratória aguda grave pelo Coronavírus 2 (SARS-CoV-2), o agente causador da COVID-19 – Capítulo 25

Vírus Ebola (um Filovirus) – Capítulo 22

Vírus marburg (um Filovirus)
Foi denominado depois que uma cidade na Alemanha onde 31 trabalhadores de uma indústria pegaram uma forma de febre hemorrágica viral, sete dos infectados morreram e por isso o vírus é considerado extremamente perigoso.

Vírus da febre Lassa (um Arenavírus)
É um vírus hemorrágico que é endêmico em países da África Ocidental, onde há mais de meio milhão de casos por ano levando a 5.000 mortes.

Vírus Nipah (um Henipahvirus), o agente causador da síndrome da encefalite aguda – Capítulo 22

Vírus Hendra (um Henipahvirus originalmente chamado de "Morbilivírus equino").
Uma infecção do vírus Hendra irrompeu em porcos em 1998 e se espalhou para humanos, levando a várias mortes. A infecção pelo vírus Hendra pode ocorrer nos pulmões, resultando em hemorragia e edema.
Pode também levar a meningite em humanos. Em 2004, houve um surto na Australia em cavalos que em poucos casos se espalhou para humanos, dois dos quais morreram. Em cavalos causa normalmente edema pulmonar e congestão e pode haver sintomas neurológicos. Este vírus tem uma taxa de fatalidade de caso de 60% em humanos e 75% em cavalos.

Todas estas doenças virais têm uma coisa em comum, seus reservatórios são morcegos. Para os vírus Ebola, Nipah e Hendra os reservatórios hospedeiros são várias espécies de morcego de fruta/raposa voadora (Pteropus -subordem Yinpterochiroptera) enquanto as outras são transportadas por morcegos menores. Morcegos também são carreadores de rubula, morbilli e hepadnavírus relacionados à caxumba humana, sarampo e o vírus da hepatite B e podem ter sido doadores desses vírus a humanos, embora agora a transmissão humano para humano seja a principal forma. 

Essas doenças também têm em comum o fato de serem causadas por vírus de RNA [MH1] de fita simples (exceto o hepadnaviridae, que é vírus de DNA com um intermediário de RNA). Eles são altamente patogênicos e produzem sintomas severos em humanos, frequentemente como resultado de uma ativação aberrante da imunidade inata. Esta resposta imune hospedeira desregulada é um importante contribuidor de danos de tecido na patogenicidade resultante da infecção e há uma mortalidade considerável.

A associação com vírus de fitas simples de RNA e não vírus de DNA pode refletir na taxa de mutações mais elevada do original, de forma que ele pode deixar seus hospedeiros reservatórios para animais de outras espécies. 

Dessa forma, em seus hospedeiros secundários, estes vírus produzem uma resposta imune forte, duradoura e frequentemente patogênica, enquanto morcegos não mostram sintomas óbvios, mantém uma infecção duradoura e persistente e os sínais da doença estão ausentes ou são mínimos. Então, por que os morcegos são tão tolerantes a vírus e por que eles não mostram efeitos patológicos desses vírus que são tão mortais para outros animais? A resposta é que: não sabemos porque pouco sabemos sobre a imunologia dos morcegos. Entretanto, há algumas indicações e elas podem envolver o estilo de vida dos morcegos por serem os únicos mamíferos voadores. Morcegos têm uma taxa metabólica muito elevada e normalmente taxas metabólicas elevadas estão inversamente correlacionadas com a longevidade, mas os morcegos vivem por um tempo comparativamente longo. Em comparação com outros animais em morcegos seria de se esperar que eles vivessem por cerca de 4 anos, mas alguns foram encontrados vivos por quase 10 anos ou mais. Morcegos estão entre as apenas 19 espécies de mamíferos que vivem mais que os humanos quando o tamanho de seus corpos é considerado. Há sugestões de que esta vida longa derive de uma maior proteção de suas proteínas contra stress oxidativo e melhor reparo de danos no DNA, como resultado da elevada taxa de metabolismo, que decorre do fato de voarem.  

Mas esses aspectos da fisiologia dos morcegos não evoluíram para permitir os morcegos tolerarem mais espécies virais assintomaticamente do que outros animais. Entretanto, esses mecanismos podem permitir que os morcegos diminuam a viremia (carga viral) e tem aparecido recentemente alguma informação sobre como isso acontece.  

Animais respondem a infecção viral, que é a presença de DNA ou RNA viral, ao produzirem interferons tipo I (interferon alfa e interferon beta). Uma célula infectada por vírus libera essas proteínas fazendo com que as células próximas aumentem suas defesas ao ativar células assassinas naturais e macrófagos, aumentando a apresentação de antígenos pelo aumento da expressão de antígenos do complexo principal de histocompatibilidade (MHC) e interferindo (daí o nome) na replicação viral. 

De uma maneira exclusiva, muitos morcegos apresentam expressão constitutiva de três genes interferon-alfa na ausência de ácidos nuclêicos virais, tendo assim seus mecanismos de defesa antivirais preparados antes da infecção e proporcionando um ambiente que irá abafar a carga viral. Tal expressão constitutiva de interferon teria sérias consequências em outros mamíferos, visto que iria causar inflamação generalizada, sugerindo que morcegos têm um mecanismo anti-inflamatório que outros animais não têm e acredita-se que este tenha evoluído para  compensar danos celulares que poderia ocorrer como resultado de serem eles os únicos animais que voam.  

Por causa dos altos e constantes níveis de interferon-alfa, vírus de morcegos podem ser eliminados em baixos níveis das células desses animais sem provocar uma resposta imune forte. A adaptação viral a estas condições em morcegos leva a outros hospedeiros (incluindo humanos) a serem mais susceptíveis a desenvolverem patologia, visto que eles não têm as condições de supressão viral. As respostas inflamatórias amortecidas de morcegos à presença de vírus de RNA suportam as idéias de que a tolerância inata imune e não a resistência, é o caminho que os morcegos desenvolveram para hospedarem muitas espécies virais com doença controlada. 

A partir do sequenciamento do genoma de morcegos foi descoberto que esses animais não têm a família de genes que codificam para proteínas que são sensores de DNA, que reconhecem DNAs estranhos tais como DNAs virais e DNA próprio resultante de infecção por RNA viral, e a alta taxa de metabolismo desses animais. Talvez isso limite a ativação da resposta imune inata levando à prevenção da inflamação excessiva. 

Apesar dos recentes avanços na compreensão da tolerância viral de morcegos, as consequências dessas interações específicas vírus-hospedeiro da imunidade de morcegos e suas implicações na compreensão de novas doenças zoonóticas ainda precisam ser estabelecidas, e como os morcegos limitam a inflamação excessiva e ao mesmo tempo hospeda assintomaticamente uma grande variedade de vírus, isso ainda não se sabe.